segunda-feira, 27 de outubro de 2014

InterferEnte Jaime Scatena em lamínima, galeria


Interferir tal vez seja o mais humano dos verbos já que a arte (o artista) trata exatamente disso: desenho ou pintura sobre papel ou tela; ponta seca sobre metal brunhido, pressão dos dedos sobre barro, goivas marteladas sobre pedras e madeiras nobres (para ficar apenas no campo clássico das artes plásticas); na procura de expressar algo que um padrão estético classifica como obra de arte.

Frutos desta interferência em materiais artísticos, acondicionados em molduras ou suportes cuidadosamente iluminados povoam museus e galerias, feiras e mercados onde certos maníacos que colecionam esses objetos dão fabulosos lances a fim de leva-los para casa e ter, assim, o privilégio de observá-los a sós (outra inexplicável mania) com orgulho e uma certa melancolia.

A arte moderna primeiro e a pop art depois vieram quebrar esses tabus e dar fim ao fetiche tratando temas cotidianos com despojamento e equilíbrio e reproduzindo, em tiragens gráficas (lito, xilo, silk e até tipografia) aquelas obras criadas, muitas vezes, sob o efeito perturbador da realidade, querendo modifica-la ou glorificando-a, sem muito sucesso no mais das vezes. A propaganda tem se mostrado mais eficaz vendendo eletrodomésticos do que ideais revolucionários. O artista possuído por essa missão resolve interferir nela (não tem mais remédio, está condenado a isso) e, sem saber como (um tanto surpreso) descobre o resultado daquela ação, depois de pronta ou seja quando esgota seu impulso interferente.




Este é o terreno onde circula a arte de Jaime K. Scatena 1, interferências (nos moldes do ready-made) em mídias apropriadas da indústria (cartões postais, mapas, azulejos) veiculadas no cyber espaço e apresentadas agora fisicamente, em matérias concretas como papel e cerâmica, prontas para serem apropriadas num leilão do mercado da arte e levadas para casa ou integrarem a coleção de um museu ou, como agora, a exposição em uma mínima galeria.


Os azulejos participam como suportes de arte nas vitrines de la mínima (uma seleção de 14 peças impressas por sublimação) e como reminiscências da infância nos cacos quebrados do piso da casa da vó (base dos mosaicos feitos à mão com os quais Jaime interfere em cartões postais e mapas).

A palavra, esse outro fetiche caro aos literatos, aparece nos textos ao verso dos cartões em mensagens que devem ser, entendo eu, dirigidas a quem as lê naquele momento ou seja, a todos e a ninguém.

Passem senhores e vejam (e leiam).


Jaime K. Scatena (São Paulo, 1977) é artista, mas também é engenheiro, jornalista e fotógrafo. Estudou fotografia no International Center of Photography (NY, 2013) e na Central Saint Martins, (Londres/2010) e História da Arte (São Paulo/2011 e Florença/2009). Seu trabalho, principalmente baseado em fotografia, explora sua personalidade que é exposta nas suas diferentes séries de auto-retratos, mas também explora o mundo, mostrando-o a partir de um ponto de vista único. Seu trabalho mais recente faz uso de códigos QR para distribuir sua arte multimídia. Jaime já participou de exposições coletivas (PopPorn 2013, Mostra São Paulo de Fotografia
2012) e individuais (São Paulo 2012, Atibaia 2011, Campinas 2006).


Serviço:

Interferente. Exposição de Jaime K. Scatena

La mínima galeria

De 28 out a 16 nov./2014

Av pedroso de morais 822

Tel. 11 3578 0003

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Arte em comum comentário de Miguel Paladino


Tal vez esteja no título de um (belo) desenho de Julia, presente na coleção, a metáfora que mais se aproxima desta mostra: cantar de dor.

O curador, Rubens Matuck, montou esta coleção de trabalhos artísticos para mostrar (penso eu) que, assim como o uirapuru, certos artistas transformam a dor em canto, a dificuldade em ferramenta, a limitação em linguagem e conseguem expressar plasticamente essa ladeira acima em que vivem, fruto de variados acidentes no percurso de uma vida que, conforme testimonio dos trabalhos aqui expostos, soube sobrepor o incomum e brilhar com luz própria, com uma luz que domina as trevas, com gestos que controlam os materiais artísticos assim como o famoso passarinho da Amazônia controla seu canto perturbado pela adversidade da dor.

A comparação pode ser viciada pela pieguice mas, como haveríamos de entender esta produção artística cujo elo comum é, justamente, ser incomum?

Em princípio todo artista (verdadeiro) é incomum e isto posto não haveria por que ressaltar essa característica ou classificar esta coleção com esse epíteto. Prefiro dizer: artistas (à margem do mercado); livres (no sentido literal do termo), autênticos (pela experiência de vida) e, portanto, verdadeiros (ou seja, incomuns).



Coleção de arte incomum / Curadoria Rubens Matuck

Obras de Julia Paladino; Francisco de Almeida;

Eduardo Villares e Osmar Santos





De 14 a 26 de outubro, 2014

Lamínima galeria / av pedroso de morais 822

Agendamento de visitas pelo telefone 3578 0003